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sábado, 25 de novembro de 2023

 

Lembrança do nosso outeiro 


Descalços, de botas cardadas ou de botas de água a que hoje chamamos galochas, os rapazes de Troino, de calções vestidos, subiam ao outeiro e dali lançavam os seus papagaios de papel, naqueles tempos em que com o aproximar do mês de dezembro já se faziam sentir fortes vendavais.

Os papagaios eram construídos pelos próprios rapazes, recorrendo a canas verdes para fazer a armação e a papel de jornal para o revestimento, alguns que conseguiam arranjar alguns trocos compravam papel colorido na papelaria do Largo da Fonte Nova dando assim uma visão mais agradável ao seu papagaio.

E, porque não havia dinheiro para luxos, o papel era colado recorrendo ao sabão preto ou a cola feita pelos próprios moços, recorrendo aos caroços de marmelo.

O grande rolo de fio para prender o “bicharoco” era aquele utilizado pelos pescadores que generosamente doavam aos rapazes.

Em dias ventosos era uma alegria naquele outeiro, por cima da Fonte da Charoca, aquela construída em nicho na Rua das Oliveiras, ver os papagaios voando lá no alto, tentando cada um superar o outro na altura a que chegavam, esvoaçando sobre os telhados do casario daquele antigo e popular bairro, dominado pela torre da Igreja de Nossa Senhora da Anunciada, onde se radicaram os pescadores oriundos das quentes terras algarvias.

Voltei hoje ao alto do outeiro para apreciar a mesma panorâmica que os rapazes da minha geração tanto gostavam e que foi lugar de muitas e salutares brincadeiras, num tempo sem facilidades, mas de grandes e fortes amizades que ultrapassando a voracidade dos tempos ainda hoje perduram

Rui Canas Gaspar

Troineiro.blogspot.com

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