notícias, pensamentos, fotografias e comentários de um troineiro

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

A última viagem dos bois do “campo do careca”

As redes da pesca de cerco, fabricadas em fio de algodão, de algumas traineiras setubalenses chegavam ao “campo do careca”, em carroças puxadas por mulas, para serem tingidas, ou seja para ficarem impermeabilizadas depois de uma passagem por alcatrão.

Num antigo tanque de rega eram despejados alguns bidons de alcatrão e as redes iam passando por dentro dele, puxadas à frente por dois pescadores e ajudados por outros dois que, cada um com um remo, iam empurrando as redes para o fundo a fim de que nada ficasse por tingir.

Depois desta passagem as redes eram postas a secar ao sol e posteriormente de novo carregadas para a doca onde seriam embarcadas nas traineiras.

E foi numa destas idas desde o tal “campo do careca” que uma carreta carregada de redes, puxada por uma junta de bois, chegou à Doca dos Pescadores, junto ao “cais do carvão” ou seja à estacada nº 1.

Mas, porque a manobra com a carreta não tivesse sido bem feita, ou porque o responsável pela mesma a quis colocar o mais junto possível da embarcação, o facto é que o acidente aconteceu.

A carreta resvalou para dentro da doca, arrastando consigo a junta de bois, para surpresa de todos aqueles homens do mar que incrédulos assistiram à cena, enquanto as redes iam para o fundo da doca.

O atrapalhado homem da carreta começou então a chamar os atordoados bois pelos seus nomes e os animais seguindo a voz do dono foram nadando até ao plano inclinado. Logo que sentiram solo firme sob as suas possantes patas trataram de abanar as orelhas sacudindo a água e começando a subir.

Já cá em cima o responsável pela carreta desatrelou os animais e levou-os de volta para a sua quinta no “campo do careca” e nunca mais aqueles animais voltaram a fazer este trabalho, sendo então substituídos por mulas.

A história é verídica e  passou-se em Setúbal há cerca de seis dezenas de anos, tendo sido  contada por Francisco Gaspar, um antigo pescador de 91 anos que assistiu à ocorrência.

O “campo do careca” ficava na Quinta da Saboaria, que começa no final poente da Avenida Luísa Todi e prolongava-se pelo espaço onde hoje estão erigidos os novos edifícios na estada que vai para as praias da Arrábida.

São “coisas de Setúbal”, são histórias da nossa terra de gente do mar.

Rui Canas Gaspar

2016-novembro-30

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Cabos e cabinhos a decorar as paredes setubalenses 

Seguramente o que mais custa a qualquer proprietário é depois de recuperar uma peça do seu património imobiliário ver que passado pouco tempo o mesmo está amplamente decorado com cabos e cabinhos das mais diversas empresas que por aí vão atuando impunemente, dando um aspeto terceiro mundista às novas artérias ou às zonas históricas.

E a pouca vergonha e impunidade é de tal ordem que nem sequer usam a calha técnica para passar os cabos pelo interior, minimizando desta forma o desagradável impacto visual.

Estes artistas colocam os cabos como lhes dá mais jeito e tanto lhes faz que eles vão por cima de placas toponímicas, por cantarias ou sobre painéis de valor histórico e, se houver cabos de antenas coletivas tratam de colocar o alicate em ação e zás! corta-se e pronto…

Ao que parece finalmente em Setúbal, na zona da baixa, os cabos vão começar a ser enterrados, a fazer fé nos trabalhos que foram iniciados na  Rua Augusto Cardoso, onde uma equipa de trabalhadores da União de Freguesias de Setúbal por lá começou a escavar.

Seria feio, muito feio mesmo que depois de mais um edifício recuperado, na Antiga Rua de São Sebastião, precisamente em frente àquele onde foi a sede do jornal O Setubalense e agora funciona um hostel, o mesmo ficasse com um arraial de cabos e cabinhos pendurados conforme a imagem demonstra.

Mesmo que os cabos fiquem  devidamente presos ao edifício não deixam de desvirtuar todo o trabalho de recuperação do imóvel, pelo que é de esperar que o enterramento dos cabos das operadoras se processe por toda a baixa.

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-29

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domingo, 27 de novembro de 2016

Obrigado setubalenses 

Esta cidade está imparável com muitos e diversificados eventos a acontecer para todos os gostos, daí que muitas pessoas ao optarem por um não possam ir a outro, o que é absolutamente natural. O que não  é natural é que continue a haver pessoas que afirmam que nada acontece nesta cidade. Pura ignorância!

Ontem, sábado 27 de novembro para a apresentação do TROIA – Um Tesouro por Descobrir, apareceram pessoas antes da apresentação que só vieram cumprimentar o autor, adquirir um livro, recolher o autógrafo e sair porque tinham outro evento.

Depois da apresentação e quando a “tralha” já estava toda arrumada outras pessoas chegaram, vindas de outro evento mas que não quiseram perder a oportunidade de vir cumprimentar e “parabenizar” pelo facto de a partir de agora termos um novo livro sobre a nossa região e que tanto diz aos setubalenses.

Mas o curioso foi ver na plateia amigos que vieram de outros convívios, alguns tendo-se deslocado a Setúbal de propósito e que também quiseram estar presentes.

Mas o mais interessante foi ver o rasgado sorriso de uma senhora que mal ali chegou, tratou logo de me dizer: “Acabamos de chegar de Troia, andamos a pé lá pelas ruínas”. Esta senhora com o seu marido foram certamente dos poucos setubalenses que teriam estado para aquelas bandas da arenosa península, neste dia chuvoso e pouco agradável.

De facto estou a falar de um casal, que tendo nascido em terras germânicas e por lá tendo vivido se apaixonou por Setúbal e já fez mais por esta cidade, de forma discreta, do que muitos “papagaios” que se arvoram de setubalenses e mais não fazem que falar mal desta terra de nascimento ou adoção.

Goste-se ou não das obras de arte que adornam a nossa terra, até há poucos anos despida de elementos escultóricos, alguém as pagou e garanto-vos que boa parte desse dinheiro não veio dos nossos impostos, mas sim daquele casal que formaram a Fundação Buehler-Brockhaus entidade que tem apoiado com muitos largos milhares de euros a arte na nossa terra. 
  
São eles que estão também a apoiar financeiramente os trabalhos de recuperação das pinturas da basílica romana de Troia.

Pessoas simples e simpáticas Marion e seu esposo Hans-Peter Buehler são de facto daquelas pessoas que considero como bons setubalenses, de quem eu gosto, que não dispensam a ida ao meu bairro de Troino almoçar o delicioso peixe assado da nossa terra.

São assim os amigos, são assim os setubalenses de nascimento ou de coração, para eles um forte abraço e o meu muito obrigado.

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-27

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sábado, 19 de novembro de 2016

Agradando aos gregos e troianos de Setúbal 

Há sempre quem não goste muito de determinados assuntos que são discutidos no grupo faceboquiano “Coisas de Setubal”, por vezes, entrando-se em infindáveis discussões, vindo logo alguém dizer que se está a “lavar roupa suja”, pelo facto de nem sempre haver concordância. Coisa  que por acaso até é salutar em democracia...

Pois em homenagem a estes personagens a Autarquia Sadina decidiu erigir-lhe um monumento e, vai daí, tratou de o colocar nesta linda manhã de sábado no Parque do Bonfim, aparecendo assim mais um pasmadinho, a famosa e emblemática “lavadeira de Azeitão”.

Mas, para que a moça não se sentisse só, embora por vezes seja preferível só que mal acompanhada, bem junto a esta foi também colocado um observador de aves daqueles que aparecem lá pelo moinho de maré da Mourisca. Isto não só em homenagem ao nosso amigo Zé, mas também a todos aqueles e aquelas que para ali vão observar a lua, as estrelas e outras coisas mais.

É claro que este pasmadinho observador deslocou-se desta vez não para a Mourisca mas para o Parque do Bonfim para ver se chegam os patos que dali sumiram e deram lugar aos repuxos.

E então não é que o rapaz acertou na mosca?!...  Bem, de facto os primeiros patos, comandados pelo general ganso já se deliciam com as águas do lago e logo que os outros reais patos saibam que há companhia e comida não deixarão de também voltar para a sua anterior residência.

E para que não se possam enganar no local saibam os patos setubalenses que agora o bonito e vetusto parque está dignamente assinalado com mais um artístico motivo, alvo de atração para os de cá e para aqueles que nos visitam.

Com repuxos e com patos bravos e dos outros a nossa Câmara Municipal conseguiu ( a ver vamos!...) agradar aos gregos e troianos setubalenses.

Rui Canas Gaspar

2016-novembro-19

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Aconteceu em Setúbal
Efeméride esquecida

Naquele outonal dia 15 de novembro de 1943, quando raras viaturas por ali se viam, um automóvel rolava a alta velocidade pela Estrada Nacional Nº 4, bem perto no lugar de Cova do Lagarto, entre Montemor-o-Novo e Vendas Novas.

A bordo vinha um dinâmico engenheiro, responsável por várias obras que estavam a mudar a face do país. Ele tinha-se deslocado logo pela manhã a Vila Viçosa para se inteirar dos trabalhos de construção da estátua de D. João IV e agora regressava a Lisboa cheio de pressa para estar a horas no Conselho de Ministros que se realizaria nessa tarde.

Um despiste fez com que o veículo fosse embater com o lado direito num dos sobreiros que bordejava a estrada e logo ali um dos acompanhantes encontrou a morte enquanto os restantes companheiros sofriam ferimentos ligeiros. Porém o de Duarte Pacheco, Ministro das Obras Publicas e Comunicações  foi bem mais grave.

As vítimas do acidente foram trazidas para Setúbal onde deram entrada no Hospital da Misericórdia, com instalações anexas à Igreja de Jesus, onde foram prontamente socorridas.

Mal foi informado da ocorrência Salazar reuniu uma equipa de reputados médicos e rapidamente dirigiu-se para Setúbal onde nada puderam fazer a não ser confirmar o óbito do dinâmico ministro, na madrugada de 16 de novembro de 1943.

Uma hemorragia interna ditou o fim daquele algarvio nascido em Loulé no dia 19 de abril de 1900, data em que se comemora a elevação de Setúbal à categoria de cidade.

Desaparecido do mundo dos vivos com apenas 43 anos este grande engenheiro e estadista deixou o seu nome ligado a Setúbal, no nascimento e na morte, sendo de assinalar as numerosas obras que promoveu um pouco por todo o nosso país, desde pontes a edifícios, sendo de salientar a sua responsabilidade na construção dos edifícios do Instituto Superior Técnico, em Lisboa.


E assim se comemora uma esquecida efeméride de um grande português que curiosamente ficou ligado a Setúbal, no nascimento e na morte, provavelmente nunca pensando que tal lhe viesse a acontecer.

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-14

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sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Deram pelo aumento do parqueamento em Setúbal? 

Quando me preparava para introduzir a moeda no parcómetro, o arrumador surge de tiket na mão perguntando se ficaria por ali mais de meia hora. Digo que não, apenas o tempo de passar pela praça, comprar alguns frescos e ir embora.

Fiquei com a senha que um automobilista que não tinha utilizado a totalidade do tempo teria ofertado ao arrumador e naturalmente gratifiquei-o pelo sua atenção.

O rapaz desata então num interessante monólogo dizendo que assim também ele poderia ser presidente da câmara. “É só aumentos! Veja lá o vizinho que os bilhetes aqui nas máquinas passaram para o dobro do preço, ou seja aquilo que pagava para uma hora de estacionamento dá agora para meia hora.”

O monólogo rapidamente transformou-se numa lamentação coletiva, dado que um outro automobilista que acabara de parquear tratou de emitir a sua opinião, um outro transeunte, bem à moda de Setúbal, ouviu e igualmente participou e como não podia deixar de ser lá estava eu também no grupo de “lamentadores”.

Ainda não consegui apurar se de facto o aumento das tarifas de parqueamento subiu para o dobro, para mais do dobro como outro afirmou, ou para menos. O facto é que subiu e subiu muito!

Se o carro para alguns pode ser um luxo, para outros é uma necessidade e como se não bastasse os elevados impostos diretos e indiretos que já sobrecarregam os automobilistas a nossa autarquia vem lançar um aumento destes…

Será que os nossos autarcas estão convencidos que pelo facto de terem mandado construir ciclovias e passar avenidas a ruas os setubalenses vão deixar o carro tão necessário para o carrego das compras e tratarem dos mais diversos assuntos um pouco por toda a cidade? Ou será que a ineficaz frota de transportes públicos setubalenses melhorou sem termos dado por isso?

Se há despesas tem de haver receitas, toda a gente sabe disso, mas assim com estes aumentos brutais não me parece aceitável, quando em contrapartida o que nos oferecem é uma mão cheia de nada.

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-11

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sábado, 5 de novembro de 2016

Semana de más notícias para Setúbal 

Não gosto de chantagem, muito menos de chantagistas e detesto ameaças, mesmo que veladas.

Digo isto a propósito da notícia que veio a lume de que a Coca-Cola não iria avançar com um projeto de ampliação das suas instalações em Azeitão, ao que parece porque a nova “lei do açúcar” (imposto que o governo se propõe levar a cabo sobre as bebidas com açúcar) iria bulir com o seu negócio.

Assim sendo, aquela multinacional deixaria o seu projeto em “banho Maria” esperançada de que o Governo pudesse rever a Lei. Ou seja, ou fazes a coisa de forma a que a gente continue a faturar bem ou se vieres com alguma ideia estranha que o negócio possa vir a diminuir não avançamos com o nosso projeto e, como tal, não admitiremos mais uns quantos trabalhadores.

Ora a meu ver isto mais não é do que chantagem, ameaça velada, ou algo muito parecido.

Aos governantes o que se pede é que governem de acordo com o superior interesse dos cidadãos e não de acordo com esta ou aquela empresa, ou este ou aquele grupo de pressão.

A semana acabou também com outra notícia nada agradável, que foi a chegada de um cargueiro com uma pequena percentagem das várias toneladas de lixo italiano para ser tratado (???) numa empresa particular que opera em Setúbal.

Os negócios das empresas são particulares, porém atendendo à especificidade da matéria-prima a mesma carecia de prévia intervenção das autoridades governamentais portuguesas, responsáveis pela área do ambiente, que a fazer fé na notícia veiculada pela RTP onde pouca ou nenhuma coordenação parece existir.

Curiosamente e de forma quase infantil, os nossos “governantes” remetem eventuais responsabilidades para o governo italiano, esquecendo-se (ou querendo fazer-nos de parvos) que o negócio do lixo por aquelas bandas está nas mãos da máfia e que esta não vai pagar para se ver livre do “lixo bom” ficando lá com o “lixo mau”.

Por outro lado, aqui na santa terrinha, logo uns setubalenses por ignorância ou má-fé, tratam de aproveitar a boleia para se atirarem com unhas e dentes à presidente da C.M.S. como se ela tivesse qualquer responsabilidade na malcheirosa importação.

E dirão alguns outros: “para que serve toda esta lengalenga na internet e os comentários dos mais diferentes opinadores?” Eu responderia: Não sei!

Mas de uma coisa tenho a certeza, a ignorância e o esconder a cabeça debaixo da areia como a avestruz nunca resolveu coisa nenhuma e, pelos vistos, alguma coisa se vai fazendo neste e noutros países graças à comunicação social que vai levantando a caça.

E não será a internet com as suas redes sociais um local privilegiado de debate, do exercício da democracia e de informação que formará os cidadãos que irão exercer o seu direito de voto de forma mais esclarecida e consciente, correndo do poleiro gente corrupta e incompetente?

Ora pois então responda quem quiser, ou souber!...

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-05

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A Antónia Soromenho partiu para o eterno acampamento

Há pouco mais de meio século  Antónia morava lá longe, no campo, perto da linha do caminho de ferro, quando poucas casas ainda existiam por aquelas bandas e para os rapazes e moças de Setúbal tudo era bem afastado, habituados como estávamos ao nosso pequeno espaço.

A menina bonita com uma longa e grossa trança negra  habituou-se a vencer distâncias e todos os dias vinha da Venda do Alcaide até Setúbal para estudar na Escola Industrial e Comercial de Setúbal.

Moça simpática de voz calma e mansa, rapidamente conquistou o nosso grupo de Escuteiros sedeado na Ordem Terceira, em Setúbal, com quem começou a conviver e foi ali que foi encontrar o Ricardo por quem se viria a apaixonar.

Do nosso grupo apenas um ficou por cá, todos os outros escuteiros partiram para a guerra colonial que os movimentos independentistas travavam em Angola, Moçambique e Guiné e foi para aí que quer eu quer o Ricardo fomos enviados para servir no Exército Português.

Regressados de África a menina da trança preta, já sem ela, casou com o jovem desenhador setubalense a quem deu dois filhos, o Rui e o Pedro.

A Antónia fez a sua carreira profissional como funcionária na Segurança Social em Setúbal, enquanto o Ricardo palmilhou milhares e milhares de quilómetros a caminho do Algarve, onde em Vila Moura foi responsável pelos projetos daquele grande empreendimento que conhece como a palma de sua mão.

Os anos passaram, mas a Antónia continuou com o seu sorriso afável, um falar calmo, que transpirava bondade e que todos lhe reconhecíamos.

Um dia sentiu que alguma coisa não ia bem com a sua boca, pensou que era um dente, mas não, era o cancro que lhe iria levar desta vida.

Os médicos fizeram o que a medicina pode fazer e que o corpo e a mente humana pode aguentar, mas foi galopante, e ontem dia 4 de novembro deste ano de 2016, um amigo comum enviava-me uma mensagem indagando se eu confirmava ou não o óbito.

Surpreendido pela notícia, telefonei a uma amiga comum que me confirmou a triste notícia. Mal tinha desligado um telefone outro tocou, era o Ricardo que me queria participar que a nossa Antónia tinha partido.

O corpo ficou em Setúbal onde estará na capela de São Paulo a partir das 11,30 e pouco depois, pelas 17,30 será levado para o Cemitério da Paz, em Algeruz, onde será incinerado.

Adeus Antónia, até um dia!...

Rui Canas Gaspar
2016-novembro-05