notícias, pensamentos, fotografias e comentários de um troineiro

sábado, 25 de novembro de 2023

 

Lembrança do nosso outeiro 


Descalços, de botas cardadas ou de botas de água a que hoje chamamos galochas, os rapazes de Troino, de calções vestidos, subiam ao outeiro e dali lançavam os seus papagaios de papel, naqueles tempos em que com o aproximar do mês de dezembro já se faziam sentir fortes vendavais.

Os papagaios eram construídos pelos próprios rapazes, recorrendo a canas verdes para fazer a armação e a papel de jornal para o revestimento, alguns que conseguiam arranjar alguns trocos compravam papel colorido na papelaria do Largo da Fonte Nova dando assim uma visão mais agradável ao seu papagaio.

E, porque não havia dinheiro para luxos, o papel era colado recorrendo ao sabão preto ou a cola feita pelos próprios moços, recorrendo aos caroços de marmelo.

O grande rolo de fio para prender o “bicharoco” era aquele utilizado pelos pescadores que generosamente doavam aos rapazes.

Em dias ventosos era uma alegria naquele outeiro, por cima da Fonte da Charoca, aquela construída em nicho na Rua das Oliveiras, ver os papagaios voando lá no alto, tentando cada um superar o outro na altura a que chegavam, esvoaçando sobre os telhados do casario daquele antigo e popular bairro, dominado pela torre da Igreja de Nossa Senhora da Anunciada, onde se radicaram os pescadores oriundos das quentes terras algarvias.

Voltei hoje ao alto do outeiro para apreciar a mesma panorâmica que os rapazes da minha geração tanto gostavam e que foi lugar de muitas e salutares brincadeiras, num tempo sem facilidades, mas de grandes e fortes amizades que ultrapassando a voracidade dos tempos ainda hoje perduram

Rui Canas Gaspar

Troineiro.blogspot.com

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

 


 

Zé da Mota quando rapaz foi conhecido por Zé dos Quadradinhos

 

José Eduardo Martins, um industrioso setubalense que muito contribuiu para o desenvolvimento desta nossa cidade, ficou conhecido entre os seus conterrâneos por Zé da Mota. O que se calhar poucos sabem é que este invulgar personagem teve como primeira alcunha “Zé dos Quadradinhos”

 

Quando era rapaz o gosto pelo cinema ocupava-lhe boa parte do tempo. O primeiro filme que assistiu foi projetado num cinema improvisado no “Lago” (atual Largo José Afonso) onde então já se realizava a Feira de Santiago.

 

A partir de então começou a ir assistir aos filmes passados nos cinemas Salão ou Casino.

 

Foi nessa altura que lhe atribuíram a alcunha de “Zé dos Quadradinhos”. A razão da alcunha prendia-se com o facto dos constantes esquemas que lhe vinham à mente, não só para entrar todos os dias no cinema sem pagar bilhete, oferecendo-se para ir à estação dos caminhos de ferro levantar as bobines dos filmes do dia com o seu carrinho de mão.

 

Ora como durante a projeção do filme era comum as peliculas se partirem o operador do projetor tinha de cortar de 10 a 20 centímetros de cada lado da fita partida antes de a colar com acetona para dar continuidade ao filme.

 

As sobras de dez centímetros davam 20 quadradinhos de fita com as figuras em cena e o rapaz combinado com o operador vendia ou trocava esses quadradinhos, ou fitas como então eram conhecidos, desde 10 a 50 centavos conforme a proximidade da figura do Tio Mackhoi ou outras estrelas de cinema desse tempo. Essas fitas eram vendidas aos colecionadores ou trocadas, como hoje se faz com os cromos.

 

Rui Canas Gaspar

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