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sábado, 29 de abril de 2017

Primeiro de Maio, dia do trabalhador 

Deveria eu ter uns 14 anos quando naquele dia primeiro de Maio, pela manhã, me dirigi para a baixa setubalense, um dia de trabalho como qualquer outro, dado que em Portugal não era feriado. 

Por cá não se assinalava o “Dia do Trabalhador” comemorativo daquela manifestação realizada em Chicago, nos Estados Unidos, no ano de 1886, quando milhares de pessoas reivindicaram as oito horas de trabalho diário. 

Minha mãe tinha-me avisado para que se visse qualquer panfleto no chão para não o apanhasse e lesse. Estava a referir-se aos panfletos espalhados durante a noite pelos militantes comunistas e passíveis dos seus leitores serem denunciados à PIDE. 

De facto, naquela manhã não vi panfletos em Setúbal, eles tinham sido espalhados, mas os eficientes serviços da polícia política tinham-se encarregado de os apanhar, tal como o fizeram com alguns conhecidos setubalenses, militantes do Partido Comunista. 

A temível PIDE, de má memória, prendera naquela madrugada vários opositores ao regime, reprimindo assim qualquer tentativa subversiva, agindo de forma preventiva e silenciando as pessoas. Daí que os próprios comentários na baixa fossem feitos à “boca fechada” quando se falava no assunto e, se dizia, que naquela madrugada o senhor Álvaro Dias, comerciante na Rua Álvaro Castelões também tinha sido preso. 

Foi necessário chegar o dia 25 de abril de 1974 para ser instituído em Portugal o feriado de Primeiro de Maio no ano de queda da ditadura e implantação da liberdade democrática. 

A exemplo de todo o país o povo saiu à rua e também em Setúbal se assistiu à maior manifestação que por cá se realizou com o povo a entupir as principais artérias da cidade. 

Passadas algumas décadas, o entusiasmo deste dia vitorioso foi diminuindo e da memória dos homens vai-se esfumando nomes de pessoas e factos históricos determinantes para a liberdade de expressão que hoje naturalmente usufruímos, como sempre assim tivesse sido. 

Julgo que é da mais elementar justiça prestar homenagem àqueles setubalenses que combatendo na clandestinidade se sacrificaram pondo em risco até a própria vida para que hoje tivéssemos a liberdade, até para dizer mal de tudo e de todos, confundindo frequentemente o estar à vontade com o estar à vontadinha. 

Rui Canas Gaspar
2017-abril-29

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