A minha primeira subida à
Serra da Arrábida
No
Verão de mil novecentos e cinquenta e pouco, as muito movimentadas ruas do
Bairro de Troino, animavam-se ainda mais com a passagem do grupo musical que as
percorria acompanhando os festeiros que tentavam coletar algum dinheiro junto dos
moradores para custear as despesas da popular Festa de Nossa Senhora da
Arrábida, de tanta devoção entre aqueles habitantes da zona poente da cidade de
Setúbal.
O
Francisco, forte pescador na casa dos 26 ou 27 anos, também lá ia no grupo, ajudando
a carregar um andor.
E
quando o dia da festa chegou mais uma vez ele segurou um dos varais colocou-o
ao ombro e ajudou a que a imagem ficasse no alto, bem destacada, até que
embarcou num grande iate de Setúbal,
daqueles muitos que ainda estavam em uso no Sado e que se encontrava acostado
ao batelão então existente no interior da Doca dos Pescadores.
E
foi atrás desse belo barco que seguiu todo o cortejo fluvial com as demais
embarcações repletas de animadas pessoas oriundas sobretudo do típico Bairro de
Troino, aquele que fica para as bandas da Igreja da Anunciada, o principal
local de culto dessa gente do mar.
Depois
do cortejo passar frente ao então Sanatório Marítimo do Outão e ter saudado
ruidosamente os doentes que ali se encontravam internados seguiu até ao
Portinho onde o iate de Setúbal parou frente ao então posto do “salva vidas” e,
uma lancha, levou pessoas e o andor para terra.
E
foi a partir daí que o Francisco, descalço, voltou a colocar o andor ao ombro
para ao som da banda e com muitas conterrâneos a acompanhá-lo subir a serra, em
cortejo, por aqueles carreiros pedregosos, até chegar ao “conventinho” onde
teriam lugar as festividades tanto apreciados pelo povo setubalense.
Entre
essa multidão que subia a serra, uma criança que deveria ter uns quatro
aninhos, lá ia alegremente pela mão de sua mãe, que seguia o marido para todo o
lado e que não poderia deixar de subir a serra para participar na festa.
Esta
foi a minha primeira caminhada por um local de grande beleza que me habituei a
gostar e esta foi uma história contada vezes sem conta por minha falecida mãe e
que meu pai, que fará 90 anos, dentro de poucos dias, me voltou a contar,
quando lhe dei a novidade de que o círio marítimo de Arrábida, interrompido há
cerca de 40 anos se iria voltar a realizar este ano de 2015.
São
Coisas de Setúbal que gosto e não me canso de escutar. São as nossas memórias que
se não forem devidamente partilhadas, sobretudo com os mais novos, esfumar-se-ão
com o passar do tempo que nos foge por entre os dedos.
Rui Canas Gaspar
2015-junho-27
www.troineiro.blogspot.com
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