O abandonado Porto de Rei
Presentemente
chamam-me Sado e pelas minhas águas já proporcionei agradáveis viagens, até 70
quilómetros para montante de barcos que transportavam mercadorias ou pessoas
umas mais importantes e outras nem por isso. Porém, olhava para todas elas de
igual maneira.
Para
as receber no meu cais designado por Porto de Rei, cinco léguas acima de
Alcácer do Sal, os homens construíram umas escadarias adossadas ao mesmo bem
como uma casa apalaçada de dois pisos onde não faltava sequer um amplo pátio com
portal brasonado e cantaria habilmente aparelhada.
Outras
casas foram igualmente construídas de forma que aquele lugar, a julgar pelo que
podemos ainda observar, deveria ter tido muito movimento de pessoas e
mercadorias.
Certo
dia apareceu por estas bandas o fumegante e mal cheiroso caminho-de-ferro e as
pessoas deixaram de utilizar as minhas águas que funcionavam como uma estrada
fluvial, trocando os meus serviços por aquela malfadada novidade.
Foi
o princípio do fim! As casas deixaram de ter manutenção, as pessoas foram
embora, as silvas e canaviais atacaram-me em força e neste bonito dia de sábado
quando recebi a visita de um amigo senti-me envergonhado, por já estar tão
afastado daquele cais onde outrora desembarcaram até nobres damas e cavalheiros
que dali seguiam para o Palácio de Vila Viçosa.
Já
há muito tempo que não recebia a visita de um amigo e o que resta de mim, agora
quase sem forças, ainda deu para fazer adeus lá de longe, enquanto ele
observava curioso as decrépitas construções que um dia também foram jovens e
belas como eu.
É
assim a vida, quando somos jovens todos se servem de nós, quando atingimos o
Inverno da vida, abandonam-nos à nossa sorte. Valham-nos os verdadeiros amigos
que de vez em quando nos visitam e se lembram de nós, partilhando com outros os
nossos momentos de pujança.
Rui
Canas Gaspar
2017-janeiro-21
www.troineiro.blogspot.com
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