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sábado, 21 de janeiro de 2017

O abandonado Porto de Rei 

Presentemente chamam-me Sado e pelas minhas águas já proporcionei agradáveis viagens, até 70 quilómetros para montante de barcos que transportavam mercadorias ou pessoas umas mais importantes e outras nem por isso. Porém, olhava para todas elas de igual maneira.

Para as receber no meu cais designado por Porto de Rei, cinco léguas acima de Alcácer do Sal, os homens construíram umas escadarias adossadas ao mesmo bem como uma casa apalaçada de dois pisos onde não faltava sequer um amplo pátio com portal brasonado e cantaria habilmente aparelhada.

Outras casas foram igualmente construídas de forma que aquele lugar, a julgar pelo que podemos ainda observar, deveria ter tido muito movimento de pessoas e mercadorias.

Certo dia apareceu por estas bandas o fumegante e mal cheiroso caminho-de-ferro e as pessoas deixaram de utilizar as minhas águas que funcionavam como uma estrada fluvial, trocando os meus serviços por aquela malfadada novidade.

Foi o princípio do fim! As casas deixaram de ter manutenção, as pessoas foram embora, as silvas e canaviais atacaram-me em força e neste bonito dia de sábado quando recebi a visita de um amigo senti-me envergonhado, por já estar tão afastado daquele cais onde outrora desembarcaram até nobres damas e cavalheiros que dali seguiam para o Palácio de Vila Viçosa.

Já há muito tempo que não recebia a visita de um amigo e o que resta de mim, agora quase sem forças, ainda deu para fazer adeus lá de longe, enquanto ele observava curioso as decrépitas construções que um dia também foram jovens e belas como eu.

É assim a vida, quando somos jovens todos se servem de nós, quando atingimos o Inverno da vida, abandonam-nos à nossa sorte. Valham-nos os verdadeiros amigos que de vez em quando nos visitam e se lembram de nós, partilhando com outros os nossos momentos de pujança.

Rui Canas Gaspar

2017-janeiro-21


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