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quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

INADMISSÍVEL!!!

Há muitos, muitos anos, quando o nosso Portugal vivia sob regime totalitário, pobre e orgulhosamente só, neste mês de dezembro, tempo de defeso da pesca da sardinha, de quando em vez vinha alguém bater à nossa porta a pedir uma esmola. Era assim que se dizia naquele tempo.

Minha mãe, nunca me falou sobre solidariedade, caridade ou fosse lá o que fosse, mas do pouco que tínhamos partilhávamos com quem vinha bater à porta da nossa pequena habitação, no típico Bairro de Troino, maioritariamente habitado por gente que retirava o seu sustento das frias águas do mar.

Foi nessa altura que aprendi a diferenciar a mão direita da esquerda. Quando minha mãe me mandava entregar a moeda de um tostão ou dois tostões à “pobrezinha” que aguardava pela esmola junto à soleira da porta de entrada de nossa casa.  Dizia minha mãe: “entrega com a mão do lado de cá” ou seja, a que ficava na direção da cozinha onde nos encontrávamos.
De facto nesse período eram duras as condições de vida das pessoas que viviam ou sobreviviam com parcos recursos e praticamente sem qualquer tipo de assistência social pública ou privada.
Os tempos passaram, a ditadura caiu naquela agradável manhã da primavera, no dia 25 de Abril de 1974. Como país deixamos de estar “orgulhosamente sós” para passar a estar agradavelmente acompanhados de várias nações europeias, não numa federação, mas numa união.
Deixamos também de ter defeso da pesca da sardinha, porque esta partiu para outras paragens e porque os barcos com que os setubalenses pescavam, tal como todos os outros pescadores foram abatidos, segundo diretivas da tal União.

Por outro lado quase que por magia, num curto espaço de tempo deixamos de ser pobres e começamos a pensar que éramos ricos. Mas… o mesmo mago que nos transformou de pobres em ricos a determinado momento resolveu de novo brincar e, vai daí, voltou a transformar-nos de ricos em pobres.

Mas esta coisa de passar de “cavalo para burro” é mais complicado… e os novos pobres, a grande maioria que nem sequer sabia o que isso era encontra-se  agora confrontada com sérios problemas, não só de adaptação à nova condição, mas sobretudo ao verem-se a braços com endividamentos para que foram empurrados pelas banca, sociedades financeiras e outras empresas do mesmo tipo.

Muitos de nós falamos, opinamos, porém desconhecemos muito da cruel e triste realidade que se vive paredes meias connosco. E, é assim que com a maior tristeza, constato que passados tantos anos, hoje sou confrontado com novos “pobrezinhos” que mais do que uma vez por semana vem bater-me à porta de casa, tal como acontecia à perto de sessenta anos.

Mas a minha maior tristeza reside no facto de numa das típicas ruas do meu querido Bairro de Troino, à noite, quando muitos de nós escutam as notícias, jantam, ou se ocupam das mais diversas atividades na internet, dezenas, ou centenas de pessoas fazerem fila para recolher uma refeição que caridosas mãos solidariamente amigas preparam voluntariamente para os nossos conterrâneos.

Ao ver este triste cenário na minha pobre terra, veio-me à mente a tal “pobrezinha” no tempo do “orgulhosamente sós” em contraponto com todos estes novos  “pobrezinhos” agora que estamos tão bem acompanhados.


Apenas uma palavra para definir esta situação: INADMISSÍVEL!!!

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