O impulsionador do Convento de Brancanes
As grandes searas
alentejanas apresentavam-se em toda a sua pujança com os campos cobertos por
douradas espigas salpicados aqui e ali por lindas papoilas vermelhas.
O calor sufocante secava as
gargantas dos trabalhadores que em grandes ranchos de homens, mulheres e
crianças colhiam o “pão”, labutando desde a madrugada até que a noite chegava e
os grilos faziam ouvir o seu estridente coro.
Daquelas loiras espigas,
colhidas com o trabalho árduo de gente humilde seria retirado o grão que se
viria a transformar no pão que alimentaria o povo.
O Verão começara há apenas
quatro dias e, naquele 25 de junho de 1631 uma senhora de origem irlandesa,
esposa de fidalgo e juiz português, transpirava profusamente na sua confortável
casa da Vidigueira. Poucos minutos depois, ela estaria a dar à luz uma criança
do sexo masculino.
Se esta senhora fosse uma
daquelas esforçadas ceifeiras o povo alentejano comentaria que tinha parido um
moço. Mas, tratando-se da esposa do fidalgo o anúncio passado de boca em boca
era o de que a senhora teria dado à luz um belo menino.
Para que a criança fosse
conhecida e diferenciada entre as demais foi-lhe colocado o nome de António da
Fonseca Soares. Ela cresceu naquela terra de gente do campo sendo alvo de todos
os cuidados próprios da sua condição social.
O rapaz desenvolveu-se,
correndo livremente pelos campos e brincando naquela terra alentejana até que
um dia seria enviado para a grande cidade a fim de estudar em Évora, no Colégio
dos Jesuítas.
Os estudos seriam
abruptamente interrompidos, quando António com apenas 18 anos tomou
conhecimento do falecimento do pai, tendo então regressado à sua Vidigueira
natal.
Não ficou por muito tempo! O
país estava em plena Guerra da Restauração, opondo o reino de Portugal à
vizinha Espanha e o jovem logo tratou de se alistar no Exército Português onde
uma carreira promissora o esperava, não fossem os seus excessos, fruto de um
temperamento impetuoso.
O despertar dos sentidos
para as questões amorosas e para a poesia levaram-no a envolver-se nas mais
diversas discussões e aventuras. Uma dessas acabou por correr mal obrigando-o em
1653 a fugir para o Brasil, quando tinha apenas 22 anos de idade. Ele ferira de
morte, em duelo, um adversário.
Depois de ter passado três
anos na Baía, o jovem alentejano regressou a Portugal e, embora sem ter
alterado o seu modo de vida a leitura de um texto de Frei Luís de Granada
despertou-lhe o interesse para os
assuntos da fé e de Deus.
Já em terras lusas, quando
corria o ano de 1656 António volta de novo a participar naquela interminável
guerra que durou 28 anos (1640 a 1668). E, porque se tratava de um jovem de
reconhecida coragem e valor, foi em Setúbal que viria a ser promovido à patente
de capitão.
Mas, contava ele 31 anos de
idade quando em maio de 1662, decide dar uma volta completa à sua vida repleta
de aventuras e experiências. Abandonou a carreira militar para se dedicar à
vida religiosa, ingressando na Ordem de São Francisco, em Évora.
A partir desse momento o
então conceituado capitão António da Fonseca Soares despe o garboso uniforme
militar e passa a envergar o hábito simples de frade franciscano, passando a
assumir a identidade de Frei António das Chagas, ou Padre António da Fonseca,
nomes porque ficaria conhecido entre o povo.
E foi precisamente graças às
diligências de Frei António das Chagas, contando com o alto patrocínio do rei
D. Pedro II, que no dia 27 de junho de 1682, em Brancanes, a noroeste de
Setúbal, a meia encosta de uma pequena colina desta vila de pescadores e
salineiros que seria lançada a primeira pedra para a construção do edifício do
Seminário para Missionários Apostólicos de Nossa Senhora dos Anjos.
Rui Canas Gaspar
2014-outubro-29
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