Na Arrábida a Fonte da
Paciência espera pacientemente que alguém trate do seu espaço.
Sou
uma das várias fontes existentes um pouco por todo o Parque Natural da Arrábida
e considero-me importante pelos mais diferentes motivos, mais que não seja
porque forneci um bem imprescindível à
vida, a água.
É
bem provável que fosse também por minha causa que, já lá vão imensos anos,se
tivessem instalado aqui perto uns romanos que se dedicavam a laborar um enorme
complexo onde conservavam peixe e fabricavam produtos seus derivados que
exportavam para os mais diversos cantos do seu vasto império.
Séculos
mais tarde criadores de gado apascentaram nas minhas imediações os seus animais
e também eles vinham aqui saciar a sede. Para além de ficar registado em foto,
posteriormente pintaram essas cenas em painéis
que hoje podem ver a decorar o espaço que ainda ocupo.
No
final do século passado, quando centenas de casas, casinhas e casinhotas
ocupavam a base da serra e espalhavam-se ao longo de todo o Portinho da
Arrábida, até aqui ao Creiro, muitos dos seus habitantes era a mim que
recorriam para pacientemente encher os recipientes com que portavam aquilo que
eu generosamente oferecia.
Não
era muito abundante, de facto, ao longo dos anos fui perdendo as forças, mas
sempre fui generosa e nunca deixei ficar ninguém mal, ainda que aqui levassem
algum tempo para encher os seus recipientes. Tinham de ter paciência, uma importante
virtude!...
A
idade não perdoa e um dia deixei de correr à vista de todos como sempre o fiz e,
não se riam, porque o mesmo irá acontecer convosco.
Os
senhores do Parque Natural da Arrábida fizeram-me uma linda sepultura e
trataram de aqui fazer um espaço de descanso e paz em minha homenagem,
inaugurando-o em 2002.
Imaginem que fizeram lindas cercaduras em
madeira tratada, colocaram bancos e um bonito mural, com três painéis de
azulejos dando conta aos visitantes que não me tinham conhecido em vida sobre a
importância que eu teria tido outrora.
Mas,
agora sinto-me triste e abandonada, com o mato a crescer à minha volta e com as
paredes do meu mural a necessitar de uma limpeza e um pouco de tinta. Nada que não se possa fazer com um pouco de
boa vontade.
Aguardo
pacientemente a chegada de alguém que voluntária ou institucionalmente me
venha, não ressuscitar, mas ao menos cuidar do espaço onde outrora dei tantas
alegrias e saciei a sede a inúmeras gerações.
Rui
Canas Gaspar
2016-fevereiro-05
www.troineiro.blogspot.com
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