Memórias do Convento de
São Francisco
No dia 15 de dezembro de
1963, alguns moradores acordam sobressaltados, com as primeiras grandes pedras
de parte das antigas muralhas que protegiam a cidade de Setúbal, a desabarem
sobre o prédio onde residiam, na Rua das Oliveiras, no bairro de Troino.
Eu e o meu amigo Marinho estávamos
com 15 anos de idade, ele morava no r/c esq. e eu no dto. E se a porta do meu
quarto não ficou bloqueada com os pedregulhos o mesmo não aconteceu com a dele,
que foi necessária alguma ajuda para o rapaz dali sair.
Felizmente a queda dos
pedregulhos não causou vítimas embora algumas habitações ficassem sem condições
de habitabilidade. Os bombeiros chamados a intervir mandaram evacuar de
imediato o edifício, temendo novo e maior desmoronamento da muralha, o que de facto
veio a suceder nas horas subsequentes.
O Governo Civil de Setúbal
apressou-se a socorrer, facilitando o alojamento das famílias afetadas por esta
ocorrência. Cedeu então, temporariamente, uma ala do primeiro andar do velho
convento de São Francisco até que as mesmas conseguissem com os seus próprios
meios arrendar novas casas.
O convento encontrava-se
nessa altura a servir de instalações de apoio ao Regimento de Infantaria 11 que
o utilizava, sobretudo como paiol e depósito de armamento.
Os Serviços Municipalizados
de Água e Eletricidade encarregaram-se de fazer chegar um cabo com energia
elétrica até à porta do edifício e foram os próprios moradores que tiveram de
fazer o resto do trabalho, ou seja, concluir a instalação elétrica nas zonas
comuns e no interior das habitações. Nessa altura o edifício ainda dispunha das
condições mínimas de habitabilidade.
Um sargento do exército e
sua esposa habitavam em permanência uma casa na ala fronteira, e os soldados
frequentemente saiam e entravam naquele quartel (termo porque era conhecido na
época) em colunas de camiões, normalmente noturnas.
Uma das dependências do
edifício encontrava-se repleta de documentação, enquanto, no andar inferior
àquele onde passaram a residir os novos ocupantes armazenava-se diverso material
de guerra, armas e munições.
Neste ano de 1963 ainda
ali podiam ser vistos alguns cavalos do exército. Constatava-se também a
existência, nas cavalariças, de algumas antigas galeras de transporte, bem como
diversos apetrechos hípicos usados pelos militares.
As famílias desalojadas
ainda estiveram naquelas instalações, do então Ministério do Exército, por um
período de cerca de dois anos até que com os seus próprios meios encontraram
novas habitações, no vizinho bairro de Troino de onde eram oriundas.
O antigo convento só viria a
conhecer nova ocupação após a chegada de refugiados das antigas colónias
portuguesas após a revolução de 25 de abril de 1974.
Rui Canas Gaspar
2014-novembro-23
www.troineiro.blogspot.com
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