A história do choco frito à moda de Setúbal
Desde o Largo da Palmeira e até à Fonte Nova, quase se poderia dizer que porta sim, porta sim, iriamos encontrar no piso térreo dos pequenos prédios de 1º ou 2º andar a indispensável taberna.
No início da segunda metade do século XX era ali que os pescadores de Troino se reuniam não só para acertarem as contas das suas pescarias, como também para conviverem jogando às cartas ou ao dominó, enquanto regavam a garganta com uns copos de vinho tinto, nos poucos momentos de ócio de que dispunham.
Manuel Coutinho residia na parte de cima de Troino, nos Olhos d´Água, na periferia poente da cidade, onde as precárias habitações eram construídas, muitas delas com o recurso a chapas metálicas recicladas de antigos bidons e a velhas tábuas de madeira conseguidas na Praia da Saúde, onde muita gente também laborava no estaleiro de construção naval.
Ele era um simples pescador que andava embarcado num dos vapores registado na capitania do Porto de Setúbal e estando farto da dura vida do mar um dia, depois de juntar alguns escudos, decidiu mudar de rumo e optar pela vida de taberneiro.
Conseguiu um espaço no Largo da Palmeira onde instalou a sua própria taberna e logo se destacou entre os seus colegas porquanto para melhor escoar o bom tinto das pipas vindas dos lados de Palmela resolveu servir também um petisco até então praticamente ignorado em Setúbal.
Manuel Coutinho logo cedo, pela manhã, dirigia-se até à beira-rio e junto à estacada do carvão comprava aos pescadores dos botes chocos bem grandes e logo ali, nas escadinhas de acesso ao rio, tratava de os cortar em tiras e lavar.
Já na taberna as tiras de choco eram de novo bem lavadas com água doce, salpicadas com umas pitadas de sal e esfregadas com alho e malagueta seguindo depois para a frigideira onde eram bem fritas, tendo o cuidado de tapar o recipiente para que não fosse salpicar e queimar as mãos do cozinheiro.
O pitéu despertou de tal modo a atenção dos clientes que rapidamente a taberna do Manuel Coutinho ficaria famosa entre as gentes do mar graças àquele novo petisco com que os homens do mar acompanhavam o vinho.
Com a fama veio a clientela e com ela o lucro devido à inovação introduzida por este antigo pescador dos Olhos d´Água, que quando faleceu deixou mais do que um considerável pecúlio, legando-nos sobretudo um manjar que se tornaria num emblemático prato da gastronomia tradicional, o choco frito à moda de Setúbal.
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