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domingo, 1 de fevereiro de 2015

Quem sabe? Quem sabe? …

Sou inglês nascido na cidade de Bedford, num período de paz entre duas grandes guerras mundiais. Era forte e movia-me a vapor e tinha tal energia que trabalhei arduamente em Portugal durante quase meio século.

Foi o Porto de Setúbal que me adquiriu para trabalhar no transporte de carvão num cais próprio para esse efeito, junto a um grande depósito que existia onde hoje está localizado o edifício de cacifos dos pescadores.

Naquele tempo para além dos muitos barcos movidos a remos e à vela, podiam ver-se  no Sado outros com grandes chaminés por onde saía o fumo negro do combustível que utilizavam, ou seja: o carvão!

Fui o primeiro guindaste a vapor a operar no Porto de Setúbal e só com quase meio século de trabalho árduo é que tive direito a reforma. Saibam que entrei ao serviço em 1924 e só tive direito a descanso em 1970.

Naquele tempo o carvão era um combustível muito utilizado, quer para usos industriais quer mesmo para usos domésticos. Alguns de vós provavelmente ainda utilizastes aquele simpático ferro de engomar com um galinho no topo, ou aquele outro mais antiguinho com uma grande boca na sua frente, lembram-se?...

A energia elétrica só chegaria a Setúbal em 1930 e foi a partir dessa altura que o carvão começaria a ter menos utilização e consequentemente eu iria passar a ter uma vida mais tranquila.

Mesmo assim, depois de passar à reforma parece que não se esqueceram de mim e a tal ponto me acharam atraente que me colocaram em exposição num pequeno espaço ajardinado bem perto da Doca do Comércio, ali para os lados daqueles verdinhos ferry-boats, que claro está, já não são movidos a carvão.

Se tiverem mais curiosidade podem vir visitar-me e verificar com os vossos próprios olhos como continuo bonito e forte, como muito provavelmente eram os vossos avós.

Embora sinta orgulho em me terem exposto para que os mais jovens possam conhecer a minha ação, só tenho pena que ainda não se tenham lembrado de colocar nas muitas rotundas que estão disseminadas pela cidade, estátuas de outros antigos e esforçados trabalhadores do meu tempo, como sejam os salineiros, os descarregadores de peixe, as operárias conserveiras, etc. etc.

Pode ser que algum dos nossos governantes ou um dos generosos mecenas que tanto têm contribuído para o embelezamento da nossa Setúbal se venham ainda a lembrar disso. Quem sabe? Quem sabe? …

Rui Canas Gaspar
2015-fevereiro-02

www.troineiro.blogspot.com

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