Quem
sabe? Quem sabe? …
Sou
inglês nascido na cidade de Bedford, num período de paz entre duas grandes
guerras mundiais. Era forte e movia-me a vapor e tinha tal energia que
trabalhei arduamente em Portugal durante quase meio século.
Foi
o Porto de Setúbal que me adquiriu para trabalhar no transporte de carvão num
cais próprio para esse efeito, junto a um grande depósito que existia onde hoje
está localizado o edifício de cacifos dos pescadores.
Naquele
tempo para além dos muitos barcos movidos a remos e à vela, podiam ver-se no Sado outros com grandes chaminés por onde
saía o fumo negro do combustível que utilizavam, ou seja: o carvão!
Fui
o primeiro guindaste a vapor a operar no Porto de Setúbal e só com quase meio
século de trabalho árduo é que tive direito a reforma. Saibam que entrei ao serviço
em 1924 e só tive direito a descanso em 1970.
Naquele
tempo o carvão era um combustível muito utilizado, quer para usos industriais
quer mesmo para usos domésticos. Alguns de vós provavelmente ainda utilizastes aquele
simpático ferro de engomar com um galinho no topo, ou aquele outro mais antiguinho
com uma grande boca na sua frente, lembram-se?...
A
energia elétrica só chegaria a Setúbal em 1930 e foi a partir dessa altura que o
carvão começaria a ter menos utilização e consequentemente eu iria passar a ter
uma vida mais tranquila.
Mesmo
assim, depois de passar à reforma parece que não se esqueceram de mim e a tal
ponto me acharam atraente que me colocaram em exposição num pequeno espaço
ajardinado bem perto da Doca do Comércio, ali para os lados daqueles verdinhos
ferry-boats, que claro está, já não são movidos a carvão.
Se
tiverem mais curiosidade podem vir visitar-me e verificar com os vossos
próprios olhos como continuo bonito e forte, como muito provavelmente eram os
vossos avós.
Embora
sinta orgulho em me terem exposto para que os mais jovens possam conhecer a
minha ação, só tenho pena que ainda não se tenham lembrado de colocar nas
muitas rotundas que estão disseminadas pela cidade, estátuas de outros antigos
e esforçados trabalhadores do meu tempo, como sejam os salineiros, os
descarregadores de peixe, as operárias conserveiras, etc. etc.
Pode
ser que algum dos nossos governantes ou um dos generosos mecenas que tanto têm contribuído
para o embelezamento da nossa Setúbal se venham ainda a lembrar disso. Quem
sabe? Quem sabe? …
Rui
Canas Gaspar
2015-fevereiro-02
www.troineiro.blogspot.com
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