notícias, pensamentos, fotografias e comentários de um troineiro

domingo, 23 de novembro de 2014

Memórias do Convento de São Francisco

No dia 15 de dezembro de 1963, alguns moradores acordam sobressaltados, com as primeiras grandes pedras de parte das antigas muralhas que protegiam a cidade de Setúbal, a desabarem sobre o prédio onde residiam, na Rua das Oliveiras, no bairro de Troino.

Eu e o meu amigo Marinho estávamos com 15 anos de idade, ele morava no r/c esq. e eu no dto. E se a porta do meu quarto não ficou bloqueada com os pedregulhos o mesmo não aconteceu com a dele, que foi necessária alguma ajuda para o rapaz dali sair.

Felizmente a queda dos pedregulhos não causou vítimas embora algumas habitações ficassem sem condições de habitabilidade. Os bombeiros chamados a intervir mandaram evacuar de imediato o edifício, temendo novo e maior desmoronamento da muralha, o que de facto veio a suceder nas horas subsequentes.

O Governo Civil de Setúbal apressou-se a socorrer, facilitando o alojamento das famílias afetadas por esta ocorrência. Cedeu então, temporariamente, uma ala do primeiro andar do velho convento de São Francisco até que as mesmas conseguissem com os seus próprios meios arrendar novas casas.

O convento encontrava-se nessa altura a servir de instalações de apoio ao Regimento de Infantaria 11 que o utilizava, sobretudo como paiol e depósito de armamento.

Os Serviços Municipalizados de Água e Eletricidade encarregaram-se de fazer chegar um cabo com energia elétrica até à porta do edifício e foram os próprios moradores que tiveram de fazer o resto do trabalho, ou seja, concluir a instalação elétrica nas zonas comuns e no interior das habitações. Nessa altura o edifício ainda dispunha das condições mínimas de habitabilidade.

Um sargento do exército e sua esposa habitavam em permanência uma casa na ala fronteira, e os soldados frequentemente saiam e entravam naquele quartel (termo porque era conhecido na época) em colunas de camiões, normalmente noturnas.

Uma das dependências do edifício encontrava-se repleta de documentação, enquanto, no andar inferior àquele onde passaram a residir os novos ocupantes armazenava-se diverso material de guerra, armas e munições.

Neste ano de 1963 ainda ali podiam ser vistos alguns cavalos do exército. Constatava-se também a existência, nas cavalariças, de algumas antigas galeras de transporte, bem como diversos apetrechos hípicos usados pelos militares.

As famílias desalojadas ainda estiveram naquelas instalações, do então Ministério do Exército, por um período de cerca de dois anos até que com os seus próprios meios encontraram novas habitações, no vizinho bairro de Troino de onde eram oriundas.

O antigo convento só viria a conhecer nova ocupação após a chegada de refugiados das antigas colónias portuguesas após a revolução de 25 de abril de 1974.

Rui Canas Gaspar
2014-novembro-23

www.troineiro.blogspot.com

Sem comentários:

Enviar um comentário