O edifício setubalense da
Casa dos Pescadores
Quatro
anos depois de ser implantada a República em Portugal, Setúbal viria a
inaugurar um belo edifício de referência na cidade, com três andares, naquele
que hoje é conhecido por Largo José Afonso, graças ao esforço e dedicação de
pescadores e “embarcadiços”.
O
edifício dos “Trabalhadores do Mar” inaugurado no ano de 1914 viria a ser
expropriado pelo Estado Novo que atribuiu àquela casa a designação que ainda
hoje ostenta no seu alçado principal “Casa dos Pescadores”.
Foi
o trabalho e dedicação de homens valentes e lutadores que levou de vencida este
projeto, sendo de destacar João da Boa-Viagem, operário conserveiro que ali fez
nascer logo nos primeiros tempos do seu funcionamento a escola para as crianças
filhas de marítimos.
Outra
pessoa a quem se deve este belo projeto é aquele que ficou conhecido pelo “homem
da boca cerrada”. Trata-se de Jaime Rebelo, pescador e líder da grande greve
dos pescadores ocorrida em 1931. Este foi o homem que cortou a sua própria
língua para não ceder à tortura dos terríveis carcereiros da polícia política,
a famosa e de má memória PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado).
O
edifício serviu muitos milhares de crianças que ali fizeram os quatro anos de estudos
básicos, tendo também sido utilizado na vertente de escola de pesca para os
rapazes que se iniciaram nas lides do mar e de escola de costura para as
prendadas meninas que geralmente não foram parar às fábricas de conservas de
peixe.
No
Inverno era comum ser servido às crianças que ali estudavam o mal cheiroso óleo
de fígado de bacalhau, que funcionava como arma contra o raquitismo. Era então
ver as crianças formadas em fila, na cantina, de boca aberta. Uma funcionária
despejava na colher o óleo que todos tinham de engolir, gostassem ou não.
Passados
muitos anos, já no início do século XXI aquando de obras levadas a cabo no
edifício foram encontradas algumas caixas com frascos de óleo sob o soalho da
cantina, vamos lá nós saber o porquê. Um desses frascos encontra-se exposto na
Mercearia pedagógica (do César) sita no popularmente conhecido Largo da Fonte
Nova.
A
par destes serviços o edifício dispunha de posto médico onde eram assistidos os
pescadores e suas famílias, bem como de uma enfermaria para dar continuidade
aos tratamentos que se impunham.
Curiosamente
era também a secretaria que funcionava no rés-do-chão daquele prédio que também
servia como farmácia para a meia dúzia de diferentes tipos de comprimidos que
os médicos de então frequentemente receitavam.
Os
comprimidos encontravam-se dentro de grandes frascos e dali eram retirados à
unidade para serem embrulhados em papel pardo e servidos aos pacientes.
Ainda
hoje o edifício se mantém aberto ao público, agora sob a alçada da Segurança
Social que ali procede ao serviço de juntas médicas.
Rui
Canas Gaspar
2017-junho-04
www.troineiro.blogspot.com
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