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segunda-feira, 6 de julho de 2015

A “aldeia” setubalense do Rio da Figueira

Já lá vão umas seis décadas quando o Francisco, num qualquer domingo de bom tempo, vestiu a sua melhor roupa, a que não faltou um casaco atado na cintura, colocou um chapéu na cabeça e decidiu quebrar um pouco da rotina, deixando de ir conviver com os outros pescadores numa das inúmeras tabernas do seu bairro de Troino para se dirigir quase para fora de portas, para a zona do Rio da Figueira.

Naqueles tempos do Estado Novo, a polícia, sobretudo a política e a fiscalização eram omnipresentes e tudo era controlado. Até o simples acender de um isqueiro, sem ter a devida licença, era alvo de coima.

O Francisco, com os seus trinta anos de idade tinha uma boa aparência e a roupa que sua preocupada e diligente esposa lhe preparara dava-lhe um ar nada condizente com os homens do mar, mais se parecendo com um daqueles burocratas ou fiscais que a população tanto temia.

Quando o nosso homem estava prestes a chegar à taberna onde iria lubrificar a garganta, já na Estrada das Machadas de Cima, foi dado o alarme por um dos clientes que se encontrava à porta e logo o estabelecimento rapidamente se esvaziou. Vamos lá nós saber porquê…

O nosso “fiscal” bebeu um copinho de tinto deu meia volta e voltou para o seu bairro, contando a peripécia à esposa e aos amigos.

Seis décadas passadas paro a viatura no estacionamento das desativadas instalações da Universidade Moderna, uns metros abaixo onde então existiu a tal taberna, saio segurando a pequena máquina fotográfica tendo por objetivo observar pormenorizadamente e fotografar o exterior do enorme edifício.

Um pouco acima uns três homens observam-me atentamente, comentam uns com os outros e vão-me seguindo com o olhar, mas agora perderam o receio e já não fogem do “fiscal”.

Por aqueles lados e a meio da manhã pouca gente passa e muito menos nas traseiras do grafitado e emparedado edifício. Porém, curiosamente seria precisamente nas traseiras do mesmo que me cruzaria com duas pessoas que pareciam estar também a fazer um reconhecimento ao imóvel.

Quando acabei de contornar, verifiquei que entravam num automóvel identificado como sendo de uma das conhecidas empresas setubalenses de pintura de imóveis.

E cá fiquei eu a pensar com os meus botões naquilo que diz o meu amigo Ricardo Soromenho, nascido para aquelas bandas, que o Rio da Figueira era uma pequena aldeia dentro da cidade, também me veio à mente o episódio ocorrido há tantos anos com o meu pai e fiquei igualmente a imaginar como ficaria agradável o edifício repintado e ocupado dando mais vida à antiga “aldeia” do Rio da Figueira.

Será que isto irá acontecer?

Rui Canas Gaspar
2015-julho-06

www.troineiro.blogspot.com

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